Boi lerdo só bebe água suja…Não seja um boi lerdo!
Um tema que todos falam é Transformação Digital. Muitos artigos apontam como serão as empresas no futuro. Mas, o futuro não chega pronto e subitamente. Ele é construído passo a passo. Primeiro aparecem sinais esparsos e aparentemente desconectados de tecnologias e mudanças sociais. Sem uma visão de contexto, não conseguimos correlacionar um ponto com outro. Só depois de algum tempo é que observamos que eles formam um padrão e que a transformação é fruto da convergência de diversas tecnologias. Portanto, olhar de forma isolada tecnologias como IA, cloud, mobilidade, IoT, robótica, RA/RV, drones, etc., não nos vai dizer muita coisa. A combinação delas é que irá provocar as mudanças. Alvin Toffler, autor de “A Terceira Onda” afirmava, com razão “As novas tecnologias nunca vêm sozinhas. É um pacote: mudanças tecnológicas, seguidas de mudanças sociais, políticas e culturais”.
O grande desafio para as empresas e seus líderes é que estão tão concentrados nos seus desafios diários, que não prestam atenção aos sinais de mudança. E então são surpreendidos. Icônico deste cenário é a BlackBerry. A história de sua decadência é um case, até comum, de como uma empresa bem sucedida não presta atenção aos sinais de mudança. O seu CEO e fundador só soube do iPhone, quando assistiu em casa uma propaganda na TV! O artigo “Inside the fall of BlackBerry: How the smartphone inventor failed to adapt” deve ser lido atentamente. Muitas outras empesas fazem o mesmo. Não seja uma nova BlackBerry!
A evolução tecnológica é exponencial e nossos pensamento linear limita nossa intuição do futuro. Por exemplo, veículos autônomos. Os sensores LIDAR que o Google usava em 2009 custavam mais de 75.000 dólares. Hoje está em torno de 7500 dólares. Custa 10% do que custava há pouco mais de sete anos! Que isso significa? Que tecnologias que são consideradas caras hoje, em poucos anos estarão bem baratas e possibilitando lançar produtos e serviços inovadores no mercado. A leitura do artigo “Google’s new self-driving minivans will be hitting the road at the end of January 2017” mostra como a indústria automotiva está se transformando. Ele cita a possibilidade da Waymo (empresa spin-off do Google) e a Chrysler criarem serviço similar ao Uber. Na prática isso mostra que em poucos anos será difícil reconhecer empresas hoje classificadas em setores distintos, como automotiva, locadora de veículos, serviços de mobilidade e mesmo seguros. E conectando impressoras 3D, drones e caminhões autônomos, haverá diferenças entre fabricantes de caminhões e as atuais empresas logísticas? Que novos negócios surgirão? Como impactarão os atuais setores, quando as fronteiras entre eles simplesmente evaporam?
Nosso modelo mental, linear, e fortemente influenciado pela sociedade industrial, como nossa formação acadêmica, nossos modelos e estruturas organizacionais, nossa legislação trabalhista, etc., impõe o conceito que o futuro é algo que simplesmente acontece a nós, enquanto, na verdade, nós é que devemos criá-lo. A reação contra mudanças é muito forte e a crença que o que deu certo por mais de 30 ou 40 anos, continuará dando certo, apenas com pequenos ajustes e melhorias, não funciona em um cenário de mudanças exponenciais. Funcionou na sociedade analógica e linear. Mas, não mais na sociedade digital. Estamos pela primeira vez nos defrontando com mudanças fundamentais acontecendo durante uma única geração. Isso é algo novo, que ainda não sabemos como lidar.
O iPhone surgiu há doze anos (em 9 de janeiro de 2007) e hoje temos negócios inimagináveis em 2007, provocado pelo simples fato de termos a Internet no nosso bolso. Surgiram negócios como Uber, Waze, Instagram, Airbnb, iFood, Gympass… Industrias sólidas desapareceram ou estão perdendo relevância. A empresa estática, criada para a sociedade industrial do século 20, não sobreviverá no século 21. O cenário de negócios é volátil, incerto, ambíguo e complexo. A empresa do século 21 tem que estar constantemente se reinventando. Deve ser uma empresa cinética. Relembrando, que a energia cinética é a energia devido ao movimento. É o caso de um corpo que recebe energia em forma de trabalho, e todo este trabalho se converte em energia de movimento. Esta forma de energia é denominada energia cinética. A empresa cinética é que todo trabalho é focado na sua reinvenção contínua. É uma empresa ágil de ponta a ponta, em constante movimento.
Olhar para o futuro e começar a construí-lo não é um exercício acadêmico. É questão de sobrevivência empresarial. Por exemplo, se a empresa atua hoje no que chamamos setor de saúde, ficar por fora de tecnologias como IoT, IA, biomedicina, etc., e não considerá-las em suas visões de futuro é colocar sua sobrevivência em risco.
A mudança acontece apenas quando o próprio CEO se engaja. Por outro lado, o CIO pode e deve assumir papel importante neste processo. Se ficar concentrado apenas no dia a dia, vai perder sua relevância. Tecnologia está se disseminando pela organização e muitas funções hoje executadas pelo tradicional setor de TI irão ser feitas de outra forma. E muito provavelmente, fora da atual TI. Um exemplo de obstáculo que muitas áreas de TI provocam nas suas empresas: não usam métodos ágeis. Ora, uma empresa cinética é ágil por natureza, e se a TI bloqueia esta agilidade com processos e métodos lentos, torna-se um bloqueador e não agregador de valor.
Para fazer a transformação digital é essencial compreender sua essência. Uma verdadeira transformação é uma reinvenção do modelo organizacional (e não o simples deslocar de caixinhas), processos digitais e muito mais ágeis, e uso intenso do conceito de digitalização. A digitalização provoca a desmaterialização, que leva à desmonetização, que potencializa a democratização de uso. O smartphone é um exemplo clássico, pois desmaterializou diversos equipamentos físicos como CDs, gravadores, GPS, câmeras fotográficas, filmadoras, etc, que estão agora embutidos em um único dispositivo, o próprio smartphone. A desmateralização barateou o custo (somem o valor de todos esses equipamentos anteriormente comprados à parte) e democratizou o uso. Comparem o antigo, caro e lento processo de fotografia analógica, com o de hoje, quando vocês tiram milhares de fotos e postam em suas redes sociais, aplicando filtros muito sofisticados, de forma totalmente gratuita. A consequência? Disrupção.
O digital é o futuro dos negócios. E dado que a sobrevivência empresarial importa imensamente para as organizações), tudo o que sua empresa fará será impactado pela mudança para o digital. A transformação digital é, gostemos ou não, a nova regra do jogo. E, para ganhar, temos que jogar este jogo. Não temos alternativas.
Já em 2011, o artigo de Marc Andreessen, “Why Software Is Eating The World” mostrava claramente esse cenário. Hoje podemos inserir um adendo dizendo que “Software will Be Eating Your Back Office” porque em breve não terá mais sentido manter custosos back offices analógicos. IA e outras tecnologias irão fazer com que grande parte dos atuais processos seja completamente redesenhado. Recomendo a leitura do estudo “The Robot and I: How New Digital Technologies Are Making Smart People and Businesses Smarter by Automating Rote Work”, produzido pela Cognizant, que mostra com dados este contexto.
Neste cenário de negócios líquido e em constante transformação, a classificação, que usamos atualmente, de empresas de acordo com seu ritmo de adoção de inovações, que vai de “inovadoras” em um extremo a retardatárias em outro, perde o significado. Uma empresa retardatária terá um ônus tão grande em perda de receita, cliente e custos maiores, que simplesmente será expelida do mercado. O novo jogo não perdoa empresas lentas. A frase de Klaus Schwab, charmain do World Economic Forum é emblemática: “Neste novo mundo não é o peixe grande que come o peixe pequeno. É o peixe rápido que come o peixe lento”.