Computação quântica: o tsunami já está em alto mar…

Cezar Taurion
5 min readNov 22, 2020

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Apesar da evolução tecnológica ao longo do último meio século, ainda existem muitos problemas que os computadores atuais não conseguem resolver. Muitos desse problemas estão e estarão fora do alcance dos computadores que temos hoje. É a perspectiva de finalmente encontrar uma solução para esses problemas “intratáveis” que tem alavancado as pesquisas para a computação quântica. Um estudo do BCG, “Where Will Quantum Computers Create Value — and When?” estima que nas próximas décadas, podemos esperar ganhos de produtividade com o uso da computação quântica, na forma de economia de custos e oportunidades de receita, que ultrapassarão os US $ 450 bilhões anualmente. Os ganhos aparecerão primeiro para empresas nos setores que demandam requisitos complexos de simulação e otimização. As aplicações que farão diferença na computação quântica são as que exploram otimização combinatória (otimização logística e otimização de portfólio de investimentos em serviços financeiros), equações diferenciais (simulação de dinâmica de fluído para projetos de automóveis e aeronaves, bem como na simulação molecular para descoberta de novas drogas), álgebra linear (sequenciamento do DNA e segmentação de clientes), e fatorização (criptografia).

Mas, o estudo também alerta que as oportunidades não serão distribuídas uniformemente. Como a computação quântica é uma tecnologia com elevadas barreiras para a adoção, como escassez de talentos, softwares diferentes dos atuais, com altos investimentos, tenderá a aumentar o fosso entre empresas e países que se posicionarem como líderes e as que ficarem para trás. Esse fosso já é palpável na adoção de IA, quando vemos uma grande concentração de talentos e pesquisas em um grupo pequeno de empresas e países. Na computação quântica, assim como em IA, o predomínio está, indiscutivelmente, com EUA e China, com as duas superpotências disputando acirradamente a liderança. IA e computação quântica estão para a preponderância política, econômica e militar como o poder nuclear estava para a guerra fria.

Por isso, apesar da realidade da computação quântica ainda está situada a pelo menos cinco a dez anos de distância (apesar do hype agressivo e otimista das empresas que estão pesquisando o assunto) é essencial que as empresas e países comecem a desenhar planos para sua adoção. A curva de aprendizado é íngreme e quanto mais cedo começarmos a escalar a encosta, mais cedo chegaremos ao cume. A computação quântica provavelmente apresentará uma curva de evolução exponencial, como já vimos acontecer com outras tecnologias da era digital, e as empresas e países que chegarem primeiro ao ponto de inflexão, aumentarão exponencialmente sua distância em relação aos retardatários.

Isso implica que no início, sua adoção será bem limitada, pelas restrições tecnológicas, mas a partir de determinado ponto sua evolução aumentará de forma rápida e sua aplicabilidade se ampliará drasticamente. O aprendizado obtido nas fases iniciais será de grande valia para a sua fase de aceleração. A formação de talentos e conhecimentos de potenciais e limitações deve, portanto, começar o mais rápido possível e não aguardar a fase pós-inflexão.

Qual minha proposta? Hoje a maioria dos líderes das organizações e de TI acreditam que a computação quântica ainda não está madura o suficiente para os resolver os negócios de hoje. A resposta é quântica. Eles estão certos e errados ao mesmo tempo. A tecnologia não está madura e nem temos software e algoritmos adequados para seu uso de forma rápida. Mas os computadores quânticos já podem resolver alguns dos problemas mais difíceis de TI, acelerando a simulação de sistemas de grande escala, como no mercado de ações e descoberta de novas drogas.

Para se preparar para esse futuro com a computação quântica, devemos considerar algumas linhas de ação, tanto para empresas, como para projeto de país:

1. Acompanhar a evolução tecnológica. Não ficar alheio ao que acontece no mundo da computação quântica. No caso do governo incentivar observatórios de acompanhamento da tecnologia pela academia e órgãos de pesquisa.

2. Identificar potenciais talentos dentro de casa e em universidades, incentivando programas de incentivo à geração de ideias e aquisição de conhecimento. As universidades deveriam inserir disciplina de computação quântica em seus cursos de ciência da computação. Afinal um aluno que inicia hoje um curso de ciência da computação, encontrará ao se formar, daqui a quatro anos, a computação quântica provavelmente já como realidade.

3. Considerar que daqui a cinco anos o cenário da computação quântica deverá criar disrupções em muitos setores. Não seria má ideia considerar esta possibilidade nas análises estratégicas de longo prazo.

Minha sugestão para os executivos das empresas e profissionais de TI, é pelo menos inserir o tópico nas discussões e iniciar, pelo menos, um programa de conhecimento básico, “quantum computing for dummies”. É o primeiro passo. A academia deveria sim, inserir a disciplina de computação quântica nos cursos de ciência de computação e, os cursos de IA, tem, por obrigação, dar base teórica (e talvez prática, usando os recursos já disponíveis ofertados por empresas de tecnologia, como Amazon e Microsoft, de “quantum computing as a service”, pois sua aplicabilidade em IA é bem grande.

E, para começar, segue aqui uma lista de artigos adicionais, voltados para executivos e profissionais de TI, sobre quantum computing, que podem dar um panorama geral de sua aplicabilidade, restrições e desafios:

“The Next Decade in Quantum Computing — and How to Play” — este artigo da BCG descreve a tecnologia, seu estado da arte, quem é quem neste ecossistema ainda emergente e as aplicações potencialmente interessantes. Analisa também os principais indicadores de investimentos, patentes e publicações; quais países e entidades são mais ativos; e o status e as perspectivas das principais tecnologias de hardware. Também avalia sua aplicabilidade e potencial.

“A game plan for quantum computing”, um estudo da McKinsey que mostra as diferenças entre a computação quântica e a computação tradicional, bem como exemplifica com potenciais aplicações.

“Recalculating the future of drug development with quantum computing”, entrevista com dois especialistas da indústria de biotecnologia, sobre uso da computação quântica na descoberta de novas drogas.

“Quantum computers and the Bitcoin blockchain”, um artigo instigante sobre os riscos que a computação quântica pode impor ao bitcoin, quebrando seu esquema de criptografia.

“Q&A: The talent shortage in quantum computing”, um debate sobre escassez de talentos.

“Quantum Computing: What Does It Mean For AI (Artificial Intelligence)?”, analisando o potencial de aplicação da computação quântica em IA, como por exemplo, na escala de “generative models”.

“Quantum computing and quantum supremacy, explained”, da Wired, com um pequeno vídeo de uns seus minutos, bem explicativo.

“The realist’s guide to quantum technology and national security”, que debate a importância da computação quântica e propõe que tenha status de política de Estado.

Pela lado mais técnico tem os livros “Quantum Computing for Everyone” de Chris Bernhardt e “Programming Quantum Computers: Essential Algorithms and Code Samples”, este publicado pela O´Reilly.

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